Com 51 anos de idade e uma carreira no entretenimento que já passou dos 25, Will Arnett pavimentou uma estrada profissional sólida, passando por algumas das mais icônicas produções de humor do século. Como membro fixo no elenco de séries como Arrested Development e BoJack Horseman, ou em participações memoráveis em 30 Rock e The Office, o quase galã de voz rouca e energia pueril sempre conseguiu equilibrar auto-exaltação, autodepreciação e vulnerabilidade ao ponto exato de fazer rir de forma calorosa. Depois de um 2021 que o viu mais em participações especiais do que como protagonista, 2022 entrega a ele um palco único para demonstrar todo esse talento.
Em Murderville, nova série de humor da Netflix, o ator conta com a ajuda de um felpudo bigode falso para viver o perturbado, mas eficiente, Detetive Sênior Terry Seattle (título que se refere à sua experiência de trabalho, e não idade, e cidade onde nunca esteve, o personagem faz questão de frisar). Trabalhando sozinho desde uma tragédia, tudo muda quando ele é incumbido de tutelar novatos na luta contra o crime, conduzindo esses trainees em casos variados de assassinato. O pulo do gato, entretanto, é que essa não se trata de uma série de TV típica: inspirada na premiada Successvile, da BBC, a nova produção da Netflix é um game de improviso onde uma celebridade convidada deve atuar de bate-pronto na trama conduzida por Arnett.
Nessa primeira temporada, o elenco de convidados prioriza estrelas de cinema e TV, mas não exclusivamente. Em ordem de exibição, os seis episódios já disponíveis são estrelados pelo apresentador de TV Conan O’Brien (A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas), o jogador de futebol americano Marshawn Lynch (Westworld), o ator Kumail Nanjiani (Eternos), a atriz Annie Murphy (Kevin Can F**k Himself), a atriz indicada ao Oscar Sharon Stone (Cassino) e o ator Ken Jeong (Se Beber, Não Case). Cada um deles deve acompanhar o personagem de Arnett na investigação de um crime diferente, sendo sempre a única pessoa do set de gravações que não recebeu um roteiro.
É inerente a essa premissa uma certa irregularidade qualitativa entre os episódios, mas o primeiro grande mérito de Murderville está em como os roteiros de Hannah Levy e Adriana Robles constroem situações engraçadas que vão além do comprometimento variável dos convidados — assim mantendo de forma regular um ótimo nível de entretenimento. Como base para o improviso, a dupla de roteiristas constrói uma narrativa com início, meio e fim para Seattle, e Arnett faz das tripas coração para tirar o máximo de risos possíveis desse aspecto da série por si só. Assim, quando a celebridade da vez abraça a zoeira e devolve bolas curvas para o ator e toda a equipe, o resultado é puro ouro cômico.
O segundo grande mérito da série está no elenco de apoio que rodeia Arnett e os convidados. Também com acesso aos roteiros, esses atores não se restringem às páginas na hora de constranger O’Brien, Nanjiani, Stone e por aí vai. Como a irritadiça chefe de polícia Rhonda Jenkins-Seattle (sobrenome que não é fruto de uma coincidência), Haneefah Wood (A Verdade Seja Dita) transforma uma boa dose de diálogos expositivos em boas piadas, e a química non-sense entre o protagonista e a perita forense Amber Kang, de Lilan Bowden (Andi Mack), são ferramentas precisas na hora de desarmar quem entra na brincadeira.
Só que, no final das contas, é inegável que tudo isso desmoronaria se não estivesse muito bem apoiado no carisma e na experiência de Arnett. Se a Netflix optar por produzir mais temporadas da série, mantendo o destaque do ator, expandindo o já excelente elenco de apoio e fortalecendo a predileção por convidados com veias cômicas pulsantes, teremos por alguns anos mais uma excelente opção de entretenimento leve, descompromissado e capaz de arrancar risadas até no mais tacanho dos dias. Murderville é um caso raro em que uma ótima ideia é equiparada pela sua execução.
Criado por: Krister Johnson
Duração: 1 temporada
