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Crítica

DC House of Horror #1 | Crítica

Inconstante como toda antologia, HQ da DC reinventa seus heróis apostando no gore

31.10.2017, às 15H23.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H35

A DC Comics aproveitou esse Dia das Bruxas para desencavar uma tradição que editoras de quadrinhos nos EUA aproveitaram bastante nos anos 1970, as antologias de horror. DC House of Horror #1 traz histórias concebidas por Keith Giffen que transformam os maiores ícones da editora em maníacos, assassinos e criaturas animalescas, dentro do perfil barato e imediato que se espera do gênero. Em alguns casos, a tendência de Giffen para o humor sobressai, mas no geral o que dá o tom é o choque e o gore.

Além de bem desenhada, a história com Superman é bem interessante porque trata não só do medo do desconhecido que vem do espaço como canaliza em Martha Kent outras problemáticas sociais que normalmente não associamos com a paz da fazenda Kent: as más relações com os vizinhos, as cobranças com a polícia ociosa de Smallville, até um comentário político negativo com o governo. É uma história brutal e compacta que consegue evocar mais de um único mal-estar.

Assim como a história com Superman investe no medo do desconhecido, a da Mulher-Maravilha, a segunda da antologia, inverte sinais sem descaracterizar a personagem e transforma a princesa amazona numa personagem saída de um horror tipo A Experiência, vingando-se de homens que cruzam seu caminho, seja com malícia seja com boa vontade. Falando grego, Mulher-Maravilha promete uma guerra sangrenta ao infernal mundo dos homens. É uma versão mais sombria da história da super-heroína mas não seria tão estranho assim imaginar uma situação em que ela traz para o nosso mundo a lógica da guerra dos gregos antigos.

Esse começo de HQ privilegia histórias que se beneficiam do formato compacto para trazer estilos mais versáteis e trabalhados de desenho, que numa HQ tradicional, longa, exigiria antes de mais nada um exercício de prazos dilatados. A história com Arlequina desenhada por Kyle Baker tira bastante vantagem dessa condição; a ideia de transformar a psicopata numa fantasma que assombra um incauto funcionário do Asilo Arkham se esgotaria rápido se não fosse o traço de Baker, que dá vida à personagem e entende que Arlequina é sempre melhor quando a desenham como uma personagem maluca dos Looney Tunes.

Essas três primeiras histórias são impecáveis, mas a seguinte, com Batman, causa os primeiros ruídos. Desenhado como uma versão sombria de Gregory Peck, ele surge atormentado como sempre, na única história até agora que parece ambientada no passado (já que as anteriores faziam menções a objetos ou eventos da atualidade, e aqui até o Batmóvel tem um design visivelmente antigo). O fato de pesadelos de Dia das Bruxas e situações de insanidade serem uma constante nas bat-HQs força Giffens a pesar a mão, para dar a esta história específica algum diferencial. O resultado é mais pensado para causar impacto do que para reimaginar o personagem.

Quando chega a história da Liga da Justiça, o gás de Giffen para imaginar premissas de horror parece começar a rarear. O foco no Lanterna Verde preserva o principal traço de personalidade de Hal Jordan, sua perseverança, mas apesar de um ou outro lance de apelo cômico bem resolvido, a história parece girar em falso na sua falta de rumo, e é o momento em todo DC House of Horror #1 que se parece mais com fanfic do que com um projeto pensado de antologia mesmo.

Já a história com Arqueiro Verde e Canário Negro, embora pareça no traço e na narrativa seca uma história protocolar para preencher espaço, traz consigo um potencial de horror porque explora justamente o lado mais sombrio do vigilantismo, sua tendência à brutalidade e ao comportamento machista. Nesse caso, Giffens aproveita o desenho mais cartunesco de Dale Eaglesham para traçar um retrato perturbado de um dos casais mais famosos da DC, sem romper com o espírito descompromissado da antologia.

Algumas histórias parecem ter na premissa apenas o potencial de um bom trocadilho, como fazer do Duas Caras um psicopata com dupla personalidade numa história meio noir de fantasia. Fica a sensação de que a DC queimara seus recursos nas primeiras histórias, as melhores da HQ, e quando se encaminha para o final a coisa começa a ficar mais repetitiva.

A HQ de Shazam!, porém, que fecha o pacote, tem a curiosidade de transcorrer como uma trama de John Hughes (em que Billy Batson lembra um pouco o Jason Patric de Garotos Perdidos, misturado com o Charlie Sheen de Curtindo a Vida Adoidado, mas mais rechonchudo), e a recontextualização do personagem, caracterizado como um típico jovem desiludido com seu figurino punk oitentista, lhe dá uma nova dimensão. Nesse caso, a história não se resume a uma premissa bem sacada, e embora seu potencial permaneça dormente (e essa é a ideia) há uma invenção ali que é invulgar. Com essa pequena história despojada, DC House of Horror #1 se encerra bem, apesar do miolo inconstante. Está aí uma tradição que poderia voltar com frequência.

Nota do Crítico
Bom

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