Música

Crítica

St. Vincent - Masseduction | Crítica

Annie Clark ousa mais e mostra a alma para o mundo ouvir

19.10.2017, às 09H15.
Atualizada em 20.10.2017, ÀS 18H01

Annie Clark voltou com tudo e com dois pés no nosso peito em Masseduction. A persona St. Vincent continua cada vez mais criativa e, agora, cada vez mais densa e complicada. As músicas são épicas, cheias de momentos carregados e pungentes. Ao mesmo tempo, o novo trabalho consegue ser mais pop e colorido do que os anteriores. É surreal como ela consegue mesclar a profundidade das mensagens com uma forma agradável sem cair no clichê ou no exagerado.

A produção de Jack Antonoff é primorosa. "Hang On Me" abre o disco com uma inquietude que permeia todo o resto do álbum. A voz é abafada, os efeitos sonoros vão invadindo o cenário e sufocando a melodia até tudo explodir num refrão que alivia a tensão e resolve a harmonia com inteligência e bom gosto. Teclados e timbres sintetizados dominam o disco, e a as batidas marteladas também adicionam drama ao caldo.

"Masseduction" transborda ansiedade. Clark parece angustiada para falar logo algo antes que ela própria exploda em desespero. “I Can’t Turn Off What Turns Me On”, ela canta rodeada de sons que parecem de outro planeta, num contraste interessante com um dos mais humanos dos sentimentos.

"Pills" é uma deliciosa e irônica correria melódica que traduz ritmicamente a loucura que é viver nos dias de hoje, e ela desaba num final dramático, querendo mostrar pra gente que mesmo quem vive correndo precisa de um momento pra si, um momento para extravasar. Senão a máquina trava. Seria uma representação sonora do nosso corpo grogue depois de tantas pílulas?

Em "Young Lover" ela exibe um vocal potente, estridente e quase desesperado. Tudo é visceral, e o disco inteiro vira uma experiência muito mais intensa por conta disso. Mesmo em "Happy Birthday Johnny", uma balada sustentada pelo piano, que aparentemente não abusa de elementos mas que cava fundo na melancolia só com os acordes cortantes e a voz furiosa dela, até um slide de guitarra entra rasgando tudo. Lindo de doer.

O quinto álbum de St Vincent, à primeira audição, parece só a evolução natural do som de Clark em relação aos discos anteriores. Mas é muito mais do que isso. Ainda em "Happy Birthday Johnny" ela canta sobre sua “new version”, e o trabalho novo reflete exatamente isso: é ela ousando mais, mas mais do que isso, rasgando sua própria alma pra todo mundo ouvir ("Los Ageless" é uma íntima confissão), sem amarras e sem medo de exagerar na dose.

É um clichê da indústria dizer que os artistas utilizam seus próprios dramas pessoais como inspiração para fazer música. Aqui o clichê pode até ser verdadeiro na medida em que ela acende um holofote em seu próprio caos, mas o resultado sonoro é avassaladoramente mais glorioso do que qualquer clichê. E não se engane: Masseduction não tem nada de deprê. É intenso, e de um jeito bem original.

Poucos artistas conseguem isso. Só quem já adquiriu muita experiência sabe transformar os calos da vida em sons como estes sem cair no mais do mesmo. 

Nota do Crítico
Excelente!

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