Como fazer um filme da A24

Créditos da imagem: A24/Divulgação

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Como fazer um filme da A24

Da isca de TikTok ao gênero elevado, analisamos o que define os filmes da casa

Omelete
4 min de leitura
23.04.2024, às 18H09.
Atualizada em 23.04.2024, ÀS 18H27

Quando a A24 foi fundada em Nova York em 2012, a ideia dos seus três idealizadores - todos eles com experiências prévias no cinema independente americano - era apostar em “filmes com um ponto de vista distinto”. Pode parecer uma definição bastante vaga para uma curadoria, mas o fato é que a A24 chega à indústria num momento em que Hollywood começava a afunilar seus interesses em direção aos monotemas: o gênero de super-heróis, os universos compartilhados, as franquias de transmídia. Nesse cenário, “pontos de vista distintos” realmente parece a coisa mais específica do mundo.

Atribuir características humanas a pessoas jurídicas é um traço dos nossos tempos, quando até mesmo os bancos privados têm seu fandom e são chamados nas redes sociais por apelidos. É preciso ir devagar, portanto, na hora de conceber essa A24 metafórica como um organismo harmônico com gostos de cinefilia bem definidos. Ao mesmo tempo, há de fato um nicho onde se encaixam os cineastas que trabalham para a casa, e debaixo do guarda-chuva generoso do “ponto de vista distinto” alguns padrões se repetem em direção ao que é mais vendável.

O principal desses padrões - a partir do qual se definem os seguintes - é a adesão à própria noção de distintividade. Não se trata de garimpar exatamente o que é original ou autêntico, e sim de procurar o que é distinto, diferente. Ao longo dessa década de atividades da A24, com uma centena de longas distribuídos (sem contar aqueles que a A24 também produz, além de lançar), esse traço se intensifica com o passar dos anos - principalmente à medida em que essa distintividade ganha contornos mais definidos e se torna uma commodity aos olhos do mercado. Do distinto ao excêntrico, então, é apenas um passo.

Isso explica por que o nome de Ari Aster se tornou sinônimo de A24, uma vez que entre Hereditário (2018) e Beau tem Medo (2023) a sua obra foi do flerte com o horror elevado para a franca extravagância de três horas de duração. Se diretores como Aster, Alex Garland e Robert Eggers são rapidamente transformados em grifes de autor, com dois ou três longas no currículo, é porque a própria indústria entende e precisa dessa distintividade para embalá-los pra consumo imediato. 

Quem deseja trilhar os passos meteóricos de Aster pode seguir as três dicas a seguir, que em alguma medida representam o que define um filme da A24:

O ultrassensível. Contar bem uma história, dentro ou fora de convenções do cinema de gênero, já não é suficiente: é preciso sentir demasiadamente, ou então articular os sentimentos com didatismo e ostensividade. Essa é a expressão mais básica de um certo exibicionismo autoral, que nos filmes da A24 se materializa tanto temática quanto textual e visualmente. É o arrojo cromático de A Lenda do Cavaleiro Verde e Moonlight, é o fluxo de consciência exacerbado de Beau tem Medo ou a extrema psicologização de A Baleia. Outros exemplos: A Ghost Story, Clímax, Vidas Passadas.

O pastiche gourmetizado e o gênero elevado. Duas facetas de uma mesma expressão artística, que é recusar o convencional para mais ou para menos - para o maximalismo ou para o minimalismo. No primeiro caso, entram os filmes que combinam comédia, drama e suspense em chave farsesca, paródica ou metalinguística para inflacionar seu impacto. Exemplos: Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, Ruído Branco, O Lagosta, Vestido Maldito, Pearl. No segundo caso, a recusa das convenções se traveste de sobriedade, e os filmes jogam muito mais com expectativas que se frustram do que propriamente com catarses de gênero. O ano fundamental dessa tendência, que marcou principalmente o cinema do horror, é 2015, quando saíram A Bruxa e Green Room pela A24. Outros exemplos: O Homem Duplicado, Ao Cair da Noite.

*Vale frisar que o “gênero elevado” não é exclusividade da A24; de qualquer forma, os lançamentos da casa que são francamente filmes de gênero - ou seja, seguem as convenções sem dobrá-las demais ou renegá-las - tendem a se eclipsar. Fica mais difícil lembrar, portanto, que a A24 um dia já distribuiu The Rover, O Quarto de Jack, O Ano Mais Violento, Enquanto Somos Jovens e A Despedida, por exemplo.   

A isca de TikTok. A fama da A24 transcende o que está nos seus filmes e é também fruto de uma máquina azeitada de divulgação. Ao mesmo tempo em que muito do perfil de um filme típico da A24 se cria posteriormente, nos cálculos do departamento de marketing do estúdio, a munição para esse hype é dada a priori nas escolhas “prontas para hitar” que esses filmes já se predispõem a criar. A expressão principal disso são as dancinhas - Oscar Isaac em Ex Machina, Florence Pugh em Midsommar, Paul Mescal em Aftersun - mas filmes inteiros podem se organizar em função desse tipo de impacto, e O Farol faz exatamente isso com sua estrutura episódica (expressar-se na direção do espectador, como Willem Dafoe faz quando grita em monólogo para a câmera, ajuda a estabelecer essa conexão direta e imediata).

 

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Bem-vindo à #A24Week! De 22 a 25 de abril, os sites irmãos Omelete e Chippu estão passeando pela história do estúdio mais badalado do momento. Além de relembrar os principais filmes, destacar pérolas escondidas e analisar o sucesso da A24, também vamos lançar um ranking com os 24 melhores filmes do estúdio. Você pode acompanhar tudo no Omelete clicando aqui, e no Chippu clicando aqui.

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